RELIGIÃO E O BOLSONARISMO – A QUESTÃO DOS ARREPENDIDOS. NÃO PODERÃO SER POSSÍVEIS ALIADOS?
Conversei
com um amigo de longa trajetória política, e
gostaria de compartilhar ideias, que talvez contribuam com o debate. São
percepções que ele teve ao participar de uma das nossas manifestações.
Este amigo ponderou inicialmente dando os parabéns ao movimento dizendo
que o caminho é por aí, que a rua tem um poder muito grande, destacando a
importância de sermos um grupo organizado neste formato de movimento livre
manifestante (com) ou sem envolvimento partidário partindo da sociedade civil
organizada, e de um público mais ou menos jovem o que é de fato revolucionário.
Teceu algumas críticas, com relação às intervenções que debatiam, por
exemplo, os religiosos e seu envolvimento com bolsonarismo, observando que nós utilizamos
muito um discurso de repulsão, com uma tendência até do menosprezo a estes
cidadãos (obviamente por que estamos com raiva dessa gente), pois se dizem
“gente de Deus” ao passo que, contraditoriamente, distorcem princípios éticos
ao inclinarem-se ao movimento bolsonarista. Raiva que se agrava ao observar
como, por meio de delírios, essas pessoas se contradizem distorcendo suas
crenças e a dita palavra de Deus, e que, fundamentando-se em inverdades
oriundas de interpretações bíblicas distorcidas, e todo tipo de provérbios, mergulham
em um mar quântico de hipocrisias.
Ponderou ainda, que marcou muito para ele a forma com que muitos
assuntos foram abordados, sendo que em algumas falas pareciam mais querer
demarcar o lugar e a posição de um determinado território ideológico. Por exemplo, a ideia de uma afirmação de que
nós estamos aqui e somos contra a postura dos evangélicos, e repudiamos os
evangélicos e as pessoas religiosas que se dizem de bem e defendem o inominável
em nome de Deus, um “Deus de justiça”, do qual se pode perguntar: que justiça?
Mas ao mesmo tempo, ponderou que no dia do movimento havia conversado
com uma pessoa que era desse grupo de evangélicos, e que estava lá, dizendo que
tinha se arrependido por apoiar o inominável no início de seu governo, mas que
estava ali justamente para colaborar e reparar certos danos de suas atitudes.
Comentava também que talvez pudesse ajudar de alguma forma com que mais pessoas se
arrependessem e se colocassem no caminho de uma luta contra o bolsonarismo
enfadonho e essa política genocida atual.
A prosa me fez pensar realmente que abordar o tema "religião", é algo bem delicado pois a grande maioria das pessoas que se envolvem com religião, são pessoas humildes, trabalhadoras que, por vezes, a única atividade social que têm é participar da igreja, de um grupo de jovens, fazer uma escuta fiel ouvindo o pastor e que, para muitos, talvez a palavra desses formadores de opinião (os pastores, padres, presbíteros) toma grande dimensão em suas vidas. Muito do que são e pensam essas pessoas, provém da influência da palavra dos pastores, padres ou presbíteros pois esse público muitas vezes não consegue formular um pensamento, uma argumentação. Há muita gente assim, infelizmente.
Este público é formado na grande maioria por pessoas fragilizadas psicologicamente por problemas
de todo tipo e, destarte, se direcionam para o caminho da fé nas igrejas para buscar refúgio, guarida, suporte emocional e espiritual. Sabe-se
também que há casos em que muitos buscam fugir do mundo do crime tentando mudar
suas vidas nos caminhos religiosos, como foi o caso, por exemplo, da tal de
Hello Kitty, a mulher traficante que foi morta pela polícia no Rio. Viram aquela notícia?
Daí então uma das ponderações de nossa conversa foi que, dependendo o
modo como falarmos nos eventos (ao abordar o assunto religião) poderemos
afastar possíveis aliados, arrependidos e indecisos que talvez possam estar
dispostos a se mobilizarem para o lado do movimento.
E sabe caros hermanos, refleti à respeito e penso que ele pode estar certo. Por que não tentarmos trazer para perto esta gente que esta ali em cima do muro, fazendo-lhes perceber por meio da retórica e o tom mais brando, talvez pensando uma abordagem conciliadora que busque aproximações com vistas a fortalecer a luta e o grupo?
Despertado pelo diálogo, logo uma fruição artística do passado me trouxe memórias de um trecho musical do Raul Seixas, cuja letra diz:
Então nessas oportunidades penso que como movimento, é importante marcarmos posição sim, sendo contra determinadas posturas, conquanto, podemos pensar em como (nos discursos) pode-se propor que essas pessoas se unam a nós. Talvez partindo da seguinte indagação: “o que, ou quais argumentos podem fazer com que eles se aproximem e não se afastem ainda mais?”
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